Sejam bem-vindos ao outro lado do espelho, onde tudo pode acontecer (e acontece).

Wonderlando é um blog sobre textos diversos, descobrimentos e crescimento. A filosofia gira em torno do acaso, misturando fantasia e realidade de dois amigos que se conheceram também por acaso, Alice - que tem um país só seu -, e Yuri - chapeleiro e maluco nas horas vagas.

Leia, comente e volte sempre... Ou faça como a gente e não saia nunca mais.

6 de agosto de 2010

High and Dry

Mareado pelo cheiro forte da falsa natureza do incensário, foi até a janela e acendeu um cigarro. Lá de cima via até onde a névoa do frio permitia ver. Deixou congelar os dedos enquanto observava a vida ao seu redor. Sombras na rua fugiam da garoa enquanto ele a encarava.

Sentia o conhaque descendo por sua garganta, o álcool em seu bafo evaporava com a fumaça da baixa temperatura misturada a do cigarro. Entristeceu por não poder mais ver o cemitério em frente à sua casa, que trazia tantas lembranças de infância e agora tampado por construções dos vivos e adultos.

A música alta, orgânica e clássica vinda do quarto dava o tom passivo da depressão. Há tempos não se sentia assim, tão como no passado. Por isso também, não gostava do frio, porque a temperatura externa refletia o seu interior, fazendo seu coração expandir até por onde não conseguia enxergar.

Suspirou olhando o céu claro em tons pastel e ficou imaginado ser sangue flutuando quando na verdade era uma rabiola vermelha presa nos fios. Pisou no chão gelado para se sentir vivo, e se sentiu. Sabia de sua vivacidade e a considerava, às vezes, uma maldição. Suas cicatrizes e machucados doíam no frio, mas ele não saiu de lá.

A tristeza invadia seu peito a cada respirar, sem resquício algum de felicidade. Contou as gotas que caiam da calha a cada três minutos. Nunca foi muito sistemático, mas gostava quando era mais Alice. Não a do País das Maravilhas, mas a do Wonderlando mesmo. Às vezes matava a saudade tentando ser um pouco mais ela ou imitando suas manias só para se sentir mais próximo e aquecido. Sempre funcionou.

Enjoado, queimou o resto do cigarro em seus dedos e deixou voar. Depois procurou a bituca desesperadamente e nem sabia o motivo. Olhou tudo a seu redor e desconheceu. Derramou álcool por todo lugar, sem querer. E, brincando com o isqueiro, ficou tentado a atear fogo em tudo ali, para esquentar mais as coisas, talvez, mas a sanidade ainda predominava. Se sentiu covarde.

Tudo estava tão molhado, mas nenhuma gota pingou de seus olhos secos.




“To all the boys and the girls outside
You know I didn’t cry
But you saw me anyway”

Um comentário:

Anônimo disse...

Seu modo de escrever mudou, desde que eu comecei a ler, até agora tá bem diferente e de qualquer forma eu gosto, apesar de agora estar mais pesado ou algo do tipo.
"But you saw me anyway".