Sejam bem-vindos ao outro lado do espelho, onde tudo pode acontecer (e acontece).

Wonderlando é um blog sobre textos diversos, descobrimentos e crescimento. A filosofia gira em torno do acaso, misturando fantasia e realidade de dois amigos que se conheceram também por acaso, Alice - que tem um país só seu -, e Yuri - chapeleiro e maluco nas horas vagas.

Leia, comente e volte sempre... Ou faça como a gente e não saia nunca mais.

25 de outubro de 2010

Sad Pony Guerilla Girl

Você diz que eu sou “loca” porque eu sou sua garota. Eu quero que brinque comigo, mas te quero sério, porque eu quero segurar a sua mão em público, poder posar nas fotos com o seu rosto no meu, sentar no seu colo para ouvir as suas histórias e chorar quando eu quiser. Sem vergonhas, sem vergonha!

Você sempre me deixa pra trás e me veste como um garoto, me disfarça porque eu sou seu amor secreto. Você diz repetidamente que nenhuma mulher ou garota te fez sentir assim antes. Se encanta com meu sorriso e meu jeitinho de quem brinca com a vida, sem responsabilidades. Você diz que eu sou estúpida por querer ser sua. Uma menina triste.

Eu quero contar pro mundo todo, você pede segredo. Mas eu quero contar quando eu brinco com meus carrinhos e você me pega por trás no banco de trás do meu carrinho. Cavalgando meu pônei eu quero te proteger e fugir com você. Me ama com seu corpo forte e cheio de tatuagens, veste minhas calças, arruma meu sutiã e vai para casa junto a suas outras crianças.

Eu vou te segurar quando tiver muito pesado. Me dê sua arma,"chico", descanse em meus braços, descanse em meu corpo. Você diz com seu sotaque latino que eu sou “loca” por querer ser somente uma garota. Eu quero ser a sua garota, seu amor eterno. Bermudas não me dizem nada, eu quero usar vestido pra sentir suas mãos subindo pelas minhas pernas. Deixa eu brincar com sua arma, vamos passear pelos bairros e atirar em quem for contra nós.

Eu vou ficar quieta e vou contar para todo mundo. E depois eu vou crescer e ficar sem graça e você vai querer me matar. Eu terei minha própria arma para nos proteger. Eu vou ficar quieta, mas vou contar até você descobrir. Então serei só uma menina triste novamente, vestida de guerrilheira com minhas roupas de menino cavalgando sozinha meu pônei, com meus carrinhos e minha arma...

22 de outubro de 2010

Sobre um suéter

Cantava.

“I want to have fun, I want to shine like the Sun, I want to be the one that you want to see, I want to knit you a sweater, want to write you a love letter, I want to make you feel better, I want to make you feel free”. Faltava o suéter. Aceitei o desafio e coloquei-me a aprender como fazer um. Comecei pela cor, lógico, o que eu já sabia. Azul-royal, já que ele, bobo, me disse que essa era a sua cor. Ri da surpresa na resposta sobre a cor favorita, pois não bastava ser “azul é a cor que mais gosto”, nem o já estranho “azul-royal é minha favorita". Tinha que ser “azul-royal é a minha cor”... havia perguntado a predileção, não sua destinação cósmica de cor! Ele riu comigo.

Então, aprendi o resto. Mas logo percebi o tempo que isto me tomaria. Não seriam dias, nem semanas. Seriam meses e meses... um grande investimento. Suspirei. Decidi ir em frente.

Escolhi com cuidado a linha, o tipo de costura e fiz um planejamento de onde queria estar ao final de cada mês. Ele, só observava... deixou todas as decisões para mim – mesmo sendo o suéter para ele.

No início, funcionei como de costume: dediquei-me e trabalhei muito. Nenhuma trança sequer fora de ritmo. Porém, os dias passaram.

Num desses, ele me perguntou como poderia sair com o suéter no tempo, de chuva e vento. Mas como! Mal começado e já com essas perguntas... pressionava-me para uma data de entrega e cogitava a possibilidade de expor meu lindo presente a tais condições perversas. Como poderia imaginar isso em tão pouco tempo de costura? Não me entendeu. Ficou em silêncio na beirada da cama... aposto que imaginando ser aquela época do mês. Dormi enfurecida, enquanto ele me olhava. Não devia.

Acordei. Triste. A vontade de tecer o suéter se foi e eu queria ir junto. Esses detalhes significavam muito, delatam como somos e predizem o futuro. E não gostei do que vi. Decidi ir e fui. Ele nem se mexeu. Mas devia.

Foi a primeira vez que deixei nosso canto. Não encostei mais no suéter. Senti a falta dele, mas ele não veio me buscar. Minha dor aumentava e decidi dar mais uma chance e ignorar os efeitos dos detalhes. Voltei. Assim, de repente. Agora que ele ia pensar mesmo que o que se passou foi a época do mês. Mas não foi.

Surpreso, levantou-se depressa para observar-me novamente tecendo o suéter no meu colo. Eu sorria, pois a saudade era tanta e senti-me boba por ter-lhe deixado. Remendei as linhas que tinha deixado fora do planejado e dormimos juntos.

O inverno chegou. E a vontade de partir também. Os detalhes voltaram para confirmar o futuro de meses atrás. Ele me fazia querer partir, a linha, a agulha, os remendos... tudo. Fazia tudo como um bobo, inclusive silenciar-se na beira da cama. Acabamos dormindo, sem palavras, sem respostas, sem decisões, sem nos tocar.

Acordei e fui. Ventava e estava frio, mas não me importei. Deixei meu lindo suéter para trás... aos pedaços e inacabado. Ele ficaria no frio o restante do inverno, assim como me deixou quando este começou. E em silêncio continuaria, na beirada da cama, imaginando como resolver nossos detalhes. Imaginando o suéter acabado, imaginando ser do meu agrado. Imaginando chorar ao não me ver. Imaginando buscar-me. Mas ele me deixou partir.

“Do you see how you hurt me, baby, so I hurt you too. And we both get so blue...”

Cantava.