Sejam bem-vindos ao outro lado do espelho, onde tudo pode acontecer (e acontece).

Wonderlando é um blog sobre textos diversos, descobrimentos e crescimento. A filosofia gira em torno do acaso, misturando fantasia e realidade de dois amigos que se conheceram também por acaso, Alice - que tem um país só seu -, e Yuri - chapeleiro e maluco nas horas vagas.

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25 de outubro de 2011

O velho que não





O barulho do isqueiro anuncia mais um trago. Puxa. O brilho laranja intensifica a cada inspirar. Nos lábios, o gosto amargo se mistura com o ferro que o sangue tem. Se morde, deixa marcas até sentir na língua o gosto. Se machuca por que se necessita.

A fumaça se espalha por dentro. Segura. Fecha os olhos e se lembra do que é. Jogado no quintal, se escondendo da luz do poste que invade amarela. Num canto escuro de suas pálpebras, se vê menino, recorda do que é e do tempo cada vez mais no fim. Se. Solta.

Expele nuvens de seu pulmão que cobrem a lua cheia. Assopra nas primaveras, de um rosa tão forte que é quase vermelho, como se ficasse gastando o lápis numa única parte. Até não ter mais lápis pra apontar. Até não ter mais lugar.  

Sangra, quando ninguém vê, se devora. Desaparece devagar, se mistura na fumaça. Evapora. Porque está pesado demais, inválido, vencido.  Quer chorar e não consegue. Quer gritar e não consegue, tem medo de perder o controle de vez. Basta os cortes, a carne, as depressões, traumas e frustrações. Quis dizer basta. Não disse.

Quando dorme, vai pra longe, porque aqui não basta. Simplesmente não dá mais. Quer dizer adeus, nunca sai. Tentou acreditar que seria diferente, que agora estava mais estável, mais coerente... Mas só ignorava as confusões, ou explicitações que lhe gritavam que aqui não satisfaz. Foi o monstro embaixo da cama, porque é o seu inconsciente inconsequente quem diz quem realmente é. Se sente um velho que não viveu, mas que também não quer. 

2 comentários:

Keyane Dias disse...

"Às vezes eu olhava minhas mãos e compreendia que podia ter sido um grande pianista. Mas o que tinha feito minhas mãos? Coçado o saco, preenchido cheques, amarrado os cadarços, puxado descargas de banheiro, etc. Desperdicei minhas mãos. Desperdicei minha mente..."

Pulp, do Bukowski.

Yuri Kiddo disse...

muito bom key.

quanto mais se desperdiça quando se chega à velhice sem chegar?