Hoje eu dei uma gaveta pra ele. Na verdade, não é uma gaveta, porque gaveta parece com gaivota ou graveto. Ele merece coisa melhor, uma cacatua ou uma araucária. A cacatua canta e a araucária dá pinhão.
Enfim, ele tem um espaço no meu quarto. Além da minha cama, do meu colchonete, do meu edredon, da minha cadeira, da minha mesa. Minha cama é pequena, o colchonete é duro, a cadeira e a mesa, desconfortáveis. Mas o edredon é bom.
Enfim, ele nem ligou pro muquifo que ganhou no meu quarto. Tudo bem que muquifos não são tão legais quanto uma gaveta, mas legal é uma palavra muito relativa. Então, relativizo a palavra "muquifo" também, para que entenda o que significa para mim. Muquifo é carinhoso, é quentinho, é raro. Nem todos sabem o que é um muquifo. Assim como nem todos sabem o que é um Grade Hill.
Enfim, eu sei que ele não disse por maldade, que não desdenhou por querer. Mas para mim é importante. Isso não significa que eu também queira uma gaveta com umas coisas minhas. Não quero não. Prefiro dormir sob sua pele.
2 comentários:
.coisinhas na gaveta é adubo para o que se sente no coração - na pele.
Muquifos no quarto, pelo menos para mim, vêm depois de muquifos no coração. E enquanto os primeiros são fáceis de se transformarem em outras coisas, em muquifos de outras pessoas, ou mesmo em outros tipos de lembranças, os segundos não se transformam. E quando o dono do muquifo parte ele (o muquifo) fica ali, vazio, incapaz de ser o novo muquifo de alguém. Fica ali para sempre, lembrando-nos do quão ruim foi a partida. Um muquifo estéril.
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