Os espíritos de luz não costumam ficar por aqui nessa época de quaresma. Eles costumam ficar em lugares melhores, talvez para não ter que comprar ovos de chocolates caríssimos. É nessa época que o mal se faz deste lado.
Era um ritual para fechar o corpo, onde ela me levou. O lugar era simples, branco e azul, enfeitado com pedras e iluminado principalmente por velas. Cravo, frutas e canelas eram colocados estrategicamente junto a uma planta chamada de tapete de wa xa illah¹. Davam um aroma natural agradável e a posição dos alimentos formava ornamentos que lembravam art nouveau.
Ela tinha saído por alguns instantes e quando voltou estava linda, de vestido branco destacando sua pele morena, com uma rosa branca presa nos cabelos lisos da cor da pele, e a prata em seu braço fazia brilhar sua luz. Feito a flor, eu estava enleado à sua imagem santa e pacificadora.
ÈPA BÀBÁ! [Viva o Pai!], era a saudação que todos gritavam. Daí um por vez pisava nesse “tapete” que fizemos e o caboclo ia dando o passe para proteção. Todos jogavam pipoca também para ajudar no descarrego e faziam a oração de proteção, de São Jorge. Não tinha entendido a pipoca, mas depois descobri que o banho de flores brancas significa a cura de doenças, um dos elementos de Omulú, o orixá que rege a morte, ou o instante da passagem do plano material para o plano espiritual. Um pouco de ebô [canjica] e arroz para Oxalá também fazia parte do cenário. Segundo a mãe de santo, podíamos comer a comida e era bom, porque se alguém nos desejasse algum mal, através de comida a gente estaria livre.
Eu não pertencia àquele lugar, no começo estava inseguro, mas depois me senti confortável e protegido. Ela me trouxera aqui por afirmar que eu era filho de Oxalá e me descreveu. Me senti lisonjeado pela descrição, mas em minha pretensão, me senti o próprio Pai, só para fazer dela minha Yemanjá. Então ela me pegou pelas mãos e amarrou uma fita amarela, me pediu para fazer um desejo, mas como não acredito nessas coisas, dei meu direito ao desejo a ela, para não desperdiçar. Ela pensou uns segundos e deu o primeiro nó. No final, me beijou os punhos e me abraçou. A gente mal se conhecia, mas tudo foi tão íntimo... Fiquei pensando o que ela havia desejado e que jamais me contaria enquanto fazíamos baixinho a oração de São Jorge:
“(...) Eu andarei vestido e armado com as armas de São Jorge para que meus inimigos, tendo pés não me alcancem, tendo mãos não me peguem, tendo olhos não me vejam, e nem em pensamentos eles possam me fazer algum mal. Armas de fogo o meu corpo não alcançarão, facas e lanças se quebrarão sem o meu corpo tocar, cordas e correntes se arrebentarão sem o meu corpo amarrar (...).”
Até que a fita amarela arrebente.
¹. “Queira Deus” em língua árabe.
wa xa illah = oxalá. Voilà!
3 comentários:
Iansã (Oyá)
Cor: Amarela
Nas cerimônias da Umbanda e do Candomblé, Iansã surge como autêntica guerreira, brandindo sua espada, mas ao mesmo tempo feliz. Sabe amar, gosta de mostrar seu amor e sua alegria contagiantes da mesma forma desmedida com que exterioriza sua cólera.
É o orixá do arrebatamento, da paixão. Ela é o desejo incontido, o sentimento mais forte que a razão.
Iansã é o orixá que faz nossos corações baterem com mais força e cria em nossas mentes os sentimentos mais profundos, abusados, ousados e desesperados.
É a falta de medo das conseqüências de um ato impensado no campo amoroso. Iansã rege o amor forte, violento.
Elemento: Fogo
Saudação: Eparrei Oiá!
Domínios: Ventos e Tempestades.
Pensei em deixar um pouco da minha 'mãe' com vc. Foi isso =)
Que, de alguma forma, te acompanhe.
Tinha um amigo espírita que falava "você tem que se proteger, você puxa muita negatividade". Perguntei para ele como eu ia me proteger pelos meios dele, "fechando o corpo?" eu disse. Então ele me contou que eu tinha que "restaurar minha tela atômica" que seria tipo uma cortina que nos envolve e nos protege de ataques espirituais, coisa assim. Não é uma boa maneira de dizer isso, parece coisa da Marvel Comics - "fechar o corpo" tem um apelo inegável.
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