Numa dessas madrugadas de Lua vermelha fico inquieto, irritado, ansioso, sensível, romântico. Nunca consigo dormir. Nesses momentos, tiro a roupa, ponho uma música, escrevo rascunhos jogados pelo quarto, ótimas ideias para textos que nunca vão acontecer. Ponho a roupa de novo e saio.
Numa dessas madrugadas de Lua vermelha eu saí de andada para tentar te encontrar, como se fosse minha Risoflora. Os cachorros latiam presos nas grades das casas, construção em cima de construção. Seus corpos ainda sem forças para atravessar paredes, mas não os seus uivos.
O asfalto ondula e desequilibra minhas pernas incansáveis. Só um dejá vù - quando se usa muitas substâncias ilícitas, às vezes o efeito volta mesmo sem ter usado nada, tome nota - As ruas são escuras, mas não guardam segredos àqueles que a pertecem. Uivo libertando o lobo dentro de mim, que por tanto tempo amarrei à rédeas curtas. Os cães me acompanham. A neblina baixa da Natureza me traz a Morte. Deparo com uma cadela caída no asfalto. Seu corpo não parecia machucado ou cansado, ela só não respirava mais. Dois filhotes, provavelmente seus filhos, e ratos, mamavam na mãe morta. Deitei a seu lado e também me banhei de seu leite. Matei minha sede.
No caminho a Natureza morta crescia em meus passos. Eu achava que tinha o domínio de algo maior que eu. O santo negro e pecador sussurrava doces venenos. Voltei onde meu sangue dormia e ateei fogo em tudo. Deitei em minha cama vazia e deparei com a decadência de uma alma morta. Tranquilidade na clareira do caos. Vi minha casa em chamas e fiquei pensando que, se eu pudesse salvar alguém, eu salvaria o fogo.
Dormi com os anjos.
Um comentário:
vejo que retorna por um texto à antiga época de imagens de tormentas.
é bom, por isso tenho medo
Postar um comentário