Mais um dia cinzento e cinza, cheio de nuvens e fumaça de automóveis e cigarros. Cheio de gente, argh. Saio de casa atrasado e desmotivado com toda aquela garoa fina. Parecia fazer frio, mas nunca aguento muito tempo de blusa. O frio parece não me atingir, só todo o resto que ele traz: tristeza, solidão, morte. Bem Bauhaus, Smiths, ou a banda responsável pelo título desse texto e trilha sonora, Morphine. More fine.
Mais um dia de busão lotado. Daqui a pouco voltam as aulas e tudo de novo. Que ciclo inteligente e esgotante (que vem do esgoto? Não, cansativo mesmo). Inteligente porque, todo fim de ano, estamos podres e querendo morrer, e como um passe de mágica o ano acaba e as esperanças são renovadas com luzes faiscantes e coloridas no céu. U-hú. Gostaria de ter esse ciclo e não viver sempre um fim de ano de 12 meses.
No caminho para o trabalho ouvi os gritos de alguém que parecia perturbado - claro, quem grita na cidade é sempre louco ou perturbado, nunca um pedido de socorro. Era um homem. Ou a Morte como ele mesmo se proclamou, e gritava: "Eu sou o último enviado por Deus, o espírito que cavalga o baio em direção ao Inferno". Identifiquei a criatura magra e amarela do lado de fora do busão. Assustando a todos pela janela, ele se jogou no chão e puxou a camiseta até rasgá-la inteira: "Deus não está aqui hoje. Só eu. Só eu!". E todos permaneciam estáticos encarando-o. E quando ele encarava de volta ninguém o olhava nos olhos. Esperei até ele me encontrar naquele mutirão de carne, e quando o fez, sorri. Ele sentou e se acalmou e sorriu de volta. Sorrimos com maldade, malícia e cumplicidade. Um sorriso morfina.
Enquanto o ônibus se afastava do ponto, pude vê-lo pondo as mãos sujas no rosto e deixando escapar as lágrimas. Sorri sem demonstrar meu pesar - Ninguém ali o merecia. Engoli seco e retomei meus fones no ouvido, mas não parei de ouvir: "Deus não está aqui hoje. Só eu. Só eu!"
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