Sejam bem-vindos ao outro lado do espelho, onde tudo pode acontecer (e acontece).

Wonderlando é um blog sobre textos diversos, descobrimentos e crescimento. A filosofia gira em torno do acaso, misturando fantasia e realidade de dois amigos que se conheceram também por acaso, Alice - que tem um país só seu -, e Yuri - chapeleiro e maluco nas horas vagas.

Leia, comente e volte sempre... Ou faça como a gente e não saia nunca mais.

22 de março de 2008

My lovely (Where do you go to)

O telefone está mais pesado do que de costume. Sua textura parece diferente. Mas a voz que busco é a mesma de sempre, mesmo sem tê-la ouvido por tempos. Sua voz ainda soa inseguramente confusa e tímida em meus ouvidos.

- Bom dia.

Fumo meu cigarro com passos firmes na rua. Evito os buracos com meu jogo de pés, minha dança sensual que tão bem desenvolvi com ele. Sei precisamente para onde estou indo. Exatamente onde ele está. Paris nunca pareceu tão ansiosa. Tão ansiosa e excitante.

Vou direto à porta do prédio, exalo um sorriso sedutor ao jovem e inesperiente porteiro. Me lembra o olhar dele quando primeiro nos vimos. Cumprimento discretamente as pessoas no hall, todos sentem minha presença. Cabeças viram, domino os pensamentos, por segundos. Ser discreta nunca foi uma habilidade minha. Uma vontade minha.

Pressiono a campainha com o toque suave dos meus dedos. Com desejo. Só a porta nos separa.
- Feliz Natal - eu digo sorrindo o sorriso que ele adora. O mesmo de sempre.
- Você fez luzes no cabelo - ele responde meus detalhes.
- Estou aqui. Gostou do presente? Não vai me convidar para entrar? - como se eu precisasse de algum convite para entrar. Ele sabe que quando quero entrar, entro para não sair nunca mais.

Um abraço. Nós ainda encaixamos. O encaixe mais gostoso que já experimentei. De tantos, há algo no dele que me serve muito bem. Nossos corpos se tocam, se sentem. Por de baixo das roupas eu o tenho, seu cheiro no meu cheiro. Nunca quis que fosse assim, mas ele era como um abrigo. Segundos de insegurança que sempre tenho com ele. Aqueles segundos pareciam eternos. E se pudesse, quereria que sim.

Cigarros. Acho que ele nunca mais tinha fumado desde que fui embora. Fraco até para pegar um novo vício. Mas eu sabia que eu era seu vício.

- Que flores lindas!
- É. É mostarda. Você sempre duvidou delas - e você sempre duvidou de mim.
- São lindas.

Finalmente nos beijamos. Minha boca chamava a dele desde o "Feliz Natal" que lhe disse. Meus lábios estavam tensos, eu estava nervosa, me fingia de segura. Minhas mãos suavam pelo seu corpo enquanto ele me despia, me mordia. Ele veria minhas novas marcas, mas isso não importa agora. Eu desejava sua fragilidade.

- Você não deveria ter me encontrado - ele resistia sem esforço.
- Você não deveria ter vindo para um lugar tão óbvio.
- Talvez no fundo eu quisesse...
- Pensei que fosse ficar no Champs-Élysées. Combina com você.
- Pensei em ficar lá. Mas combina com você - para ele, tudo combinava comigo.
- Sabia que iria te encontrar por aqui.
- Viva la résistance!

Fizemos silêncio, fizemos um beijo. Eu deveria ir, antes de fazer o que não devia.
- Eu vou embora.
- Pra onde?
- Pra longe.
- Eu acho que vou também. Alemanha ou Amsterdã, ainda não sei... fiquei tempo demais aqui.
- A Alemanha engorda. E vai te partir o coração.
- Mais do que você, eu acho que não.

Era verdade. E eu medrosamente me orgulhava disso. Me levanto para ele não ver meu olhar de pesar. Ele pega três flores de mostarda e coloca em meus cabelos. Me olha me querendo, me desprezando, me deixando. Eu não lhe dava escolhas, não tínhamos escolhas, odeio escolhas.
Silêncio.

- Quer ver a visão que eu tenho de Paris?

Eu concordo com a cabeça. Ele pega em minha mão e caminha em direção à sacada. Então, no meio do caminho, coloca-me em frente a um espelho e me abraça por trás. Mal sabia ele que esta era a mesma visão que eu tinha de Paris. De mim. Dançamos a noite inteira. A última de várias outras últimas.

Um comentário:

Yuri Kiddo disse...

hahaha! =D
que divertido isso. uma outra visão de uma velha história. ou uma nova versão de uma nova história? ou... simplesmente o que é.