Queria que não me beijasse somente quando bêbado. Na verdade, queria que só me batesse quando bêbado. Mas não se pode ter tudo, não é isso que dizem por aí?
Nos nossos longos momentos de silêncio, temo usar indevidamente minhas palavras, para não quebrar a nossa harmonia do instante. Ficamos tão bem juntos no silêncio. Admiro seus traços de longe, evito interferir no seu ambiente. Evito ser percebida. Gosto de ser uma sombra, um fantasma.
Se me nota, te assusto. Desculpe o caos, você me paga igual. Desordenadamente, pune-me por estar ali percebida. Aturo sua fúria e busco minhas próprias saídas. Penso no Havaí e de como deve ser gostoso ficar na praia comendo frutas. Ou lembro-me do dia em que brinquei com os coelhos da minha tia e um deles me mordeu. Fiquei tão assustada na época, mas com o tempo entendi aquela ser sua natureza.
Hoje, sei os modos, seus modos. Nos nossos silêncios, gosto às vezes de me aventurar numa brincadeira de luta e cócegas. Assim que de vez em quando justifico meus machucados para os outros... e frequentemente para mim. Mas este é um momento tão feliz, pois me toca com delicadeza e imagino que suas mordidas, na realidade, foram beijos que você arriscou a dar. Então você percebe que sorri e se afasta brutalmente, iniciando outro ciclo de réplicas e desapegos.
Queria ter escrito mais ambiguidades, para que, neste texto, não ficasse claro quem sou eu ou para que nos mesclássemos nos pronomes e verbos. Fundidos, poderia então te odiar com a liberdade com que me odeio.
2 comentários:
sua libertação poética me bateu como um estrondo. pequenas metáforas, grandes sensações.
você bem sabe.
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